04/06/2020 – No último dia 30, durante a cobertura de mais um protesto nos Estados Unidos pelo assassinato de George Floyd por um policial branco, a câmera da Globonews flagrou ao vivo um homem negro, sem camisa, sendo imobilizado com brutalidade por policiais de Manhattan. A jornalista (branca) Leila Sterenberg descreveu a cena ao vivo da seguinte forma: “a gente não sabe o motivo, se ele estava tentando roubar alguém… A gente não tem os detalhes, então a gente SUPÕE que tenha sido alguém, talvez, querendo bater carteira de manifestantes”. O assassinato de Floyd, um homem negro asfixiado sob o joelho de um policial branco, numa operação muito similar à descrita pela jornalista da Globonews, vem provocando a maior onda de manifestações dos últimos 50 anos nos EUA.
Em outra notícia relacionada, Sérgio Camargo, presidente da Fundação Cultural Palmares (FCP), ofendeu, acusou e ameaçou perseguir militantes do movimento negro e líderes de religiões de matriz africana. Classificou o movimento negro como “escória maldita”, que abriga “vagabundos”, e chamou Zumbi de “filho da puta que escravizava pretos”. “Não vai ter nada para terreiro enquanto eu estiver aqui dentro, zero, nada. Macumbeiro não vai ter um centavo”, disse. Como se fosse pouco, Camargo é negro e a Fundação Palmares é uma instituição federal destinada a promover a formação, articulação e execução de políticas públicas afins com a diversidade da cultura afro-brasileira.
O SINTSEF-BA e a CONDSEF/FENADSEF repudiaram com firmeza as declarações. Para a Confederação, “a fala de Sérgio Camargo contraria os valores da instituição, fere o País e enquadra o apoiador do presidente Jair Bolsonaro em crime de racismo (…). De acordo com o Conselho Nacional de Justiça, o crime de racismo atinge uma coletividade indeterminada de indivíduos, discriminando toda a integralidade de uma raça. Ao contrário da injúria racial, o crime de racismo é inafiançável e imprescritível. Nesses casos, cabe ao Ministério Público a legitimidade para processar o ofensor”.
O SINTSEF-BA lembra que o comportamento de Camargo não é isolado. “Não podemos esquecer que ele é mais um quadro típico do governo Bolsonaro”, alerta Pedro Moreira, Coordenador Geral do SINTSEF-BA. Para ele, Camargo é tão racista, intolerante, incompatível com o cargo que ocupa e com manias de perseguição quanto Regina Duarte, Abraham Weintraub, Damares Alves e Ricardo Salles, por exemplo. “Há uma coerência, aí, portanto. Um projeto de destruição das importantes conquistas sociais trazidas por essas pastas nos últimos anos”, observa.
Erilza Galvão, Coordenadora de Formação do SINTSEF-BA, Secretária de Gênero e Raça da CONDSEF/FENADSEF e integrante do Comitê de Raça da Internacional de Serviços Públicos (ISP), nota também que o episódio relaciona-se ao crescimento de ideologias fascistas em que estamos submetidos no Brasil e no mundo. “E o enfrentamento tem se dado em igual medida lá e cá, embora insistam em dizer o contrário. Não por acaso, o Presidente da FCP chegou a ter sua nomeação barrada pela justiça, meses atrás, por conta de declarações anteriores no mesmo tom das atuais”, recorda. E desta vez a resistência não será diferente. A luta antirracista é cotidiana e sem tréguas.
A esse respeito vale resgatar o que disse a escritora Ana Maria Gonçalves em uma excelente entrevista ao podcast “Nós da Imprensa”. “Não somos mais passivos [que os americanos]. Se analisarmos a luta do negro no Brasil, desde a época da escravidão, veremos que ela vem sendo escondida e reprimida com muito mais violência do que o que acontece lá [nos EUA]. A gente tenta fazer os protestos e rapidamente dá-se um jeito de uma polícia defensora do Estado e da sociedade privada reprimi-los. A Polícia Militar em suas origens tinha por objetivo proteger a propriedade privada brasileira e os bens estatais e tinha como uma de suas grandes funções caçar negro fugido. Essa mentalidade continua até os dias de hoje”.
Reverter esse quadro é tarefa de todos nós. As raízes do autoritarismo e as chamas do fascismo alimentadas pelo governo Bolsonaro não podem continuar a arder impunemente. Queremos respirar! Vidas negras importam.